Você se imagina como um super-herói/heroína? Que a qualquer perigo, independentemente do teor, consegue sempre salvar tudo e a todos? Acho que não. Afinal, todos nós temos as nossas vulnerabilidades, que nem sempre queremos mostrar ao mundo. Erramos aqui, acertamos dali. A questão principal é entender que esses “pontos fracos” – que de fracos não têm nada – podem ser utilizados ao nosso favor. Assim, estamos longe de ser super-heróis, mas isso não significa que não temos nossos próprios poderes.
Não chegaremos a voar e nem a atravessar paredes. Contudo, conhecer nossos poderes é o ponto chave para começarmos o caminho da autorrealização e do autoconhecimento – que, como dito no artigo sobre Modernidade Ar, constitui a nova fase da nossa sociedade. E isso é muito melhor do que simplesmente atravessar paredes, não é?
Por isso, o primeiro passo é entender quais são seus soft powers e hard powers. Essa teoria, criada por Joseph Nye, um dos fundadores da teoria liberal, é utilizada normalmente no campo das Relações Internacionais para identificarmos as relações de poder entre as nações. Entretanto, como diz Pierre Bourdieu em sua concepção de Campo, sempre podemos identificar o macro no micro. Ou seja, essas definições criadas por Joseph Nye podem também ser aplicadas a nós, indivíduos sociais.
Todos somos duo – Ying-yang
Antes de falarmos sobre tais definições difundidas por Nye, vamos às origens. Segundo o Taoismo, uma das filosofias mais antigas da história da humanidade, somos regidos por duas forças constantes que, apesar de opostas, se complementam: Ying-Yang.
O símbolo Ying-Yang significa, literalmente, “lado escuro” e “lado claro” da montanha. Ele se refere às fases complementares da natureza e, por isso, do ser humano. Essas fases estão sempre em constante mudança e alternância para gerar a estabilidade. É a relação harmoniosa dos opostos no universo.
É algo como: sem o frio, você saberia o que é calor? Sem o amargo, você saberia o que é doce?
De maneira rápida, podemos entender que:
· Yang representa a luz, o fogo, a visão, a atividade e a essência masculina (veja, não é homem, mas sim os aspectos masculinos);
· Ying representa a escuridão, a terra, a passividade, a calmaria e a essência feminina.
Para essa filosofia, tudo carrega em si o seu oposto. Ou seja: ninguém é exclusivamente masculino ou feminino; emotivo ou racional; introvertido ou extrovertido.
É nesse sentido que, quando pensamos em indivíduos na pós-modernidade, a teoria de Nye pode nos ajudar.
Descobrindo seus poderes
Apenas por meio da soma das forças opostas que é possível criar o novo e a estabilidade. Nye utilizou essa ideia ao dividir o poder em hard power e soft power.
O poder para Nye, em sua noção central, é baseado em três aspectos: manifesta-se como a capacidade de impor comportamentos e resultados; tem a força de criar agendas/projetos ao definir quais temas terão relevância; e molda as preferências e os interesses dos indivíduos.
Mas como isso se aplica a nós? Quais são os nossos poderes?
· Soft Power: assim como a força Ying, o soft power é o poder da atração positiva, da calmaria, do trabalho interno. Ou seja, o poder do carisma, das emoções e da conversa. O jeito sutil de ver o mundo. Invariavelmente, o soft power é intangível. Porém, é ele a principal base que influencia nossos hábitos e valores. Será ele que irá determinar o que fazemos e como fazemos. É o que Pierre Bourdieu chama de Capital Simbólico e Cultural.
· Hard Power: assim como a força Yang, o hard power é o poder coercitivo, do corpo, da atividade e da mudança. Para Nye, o hard power é ligado à força militar, às sanções, aos embargos, às parcerias, à posição hierárquica e aos investimentos financeiros. É esse poder que pede um maior poder de articulação dos indivíduos para se buscar aquilo que se almeja.
Como é possível notar, ambos os poderes são essenciais para a estabilização de um indivíduo. Quantas vezes você não teve que utilizar o carisma para realizar uma parceria ou até mesmo conquistar um(a) pretendente? Quais foram as estratégias utilizadas, os muros derrubados a duras penas graças ao seu controle emocional e à sua resiliência?
Ainda está abstrato? Vamos pensar num escultor nada singelo: Michelangelo.
Para esculpir Davi, sua obra prima, Michelangelo teve que buscar o equilíbrio. Ele aplicou força suficiente para quebrar a pedra e sutileza o bastante para que as formas suaves de Davi surgissem. Se aplicasse muita força, Davi poderia até nascer. Contudo, estaria deformado aqui e ali… E talvez tudo viraria pó.
O contrário também é verdade: com muita sutileza, a pedra não iria se quebrar e ela nunca deixaria de ser um bloco. E veja: Davi sempre esteve lá, dentro da pedra. Entretanto, só foi possível seu surgimento por meio do equilíbrio de forças.
O equilíbrio é a chave
E essas forças já estão presentes. Afinal, todos temos o Ying e o Yang dentro de nós – assim como temos o soft e o hard power. O equilíbrio é o grande segredo da harmonia interna. Apenas com ele que temos força suficiente para o dar o próximo passo, sem pestanejar, sem dúvidas.
Nem sempre essa balança estará totalmente equilibrada, mas a busca pelo equilíbrio é que deve ser perpétua – segundo a filosofia taoísta, esse trabalho é um dos mais importantes que temos na vida. Afinal, as forças podem ser opostas, mas são complementares.
Por essas forças estarem em constante mudança de acordo com o ambiente, época e momento pessoal, nós devemos saber seguir essa valsa.
Entender qual é o soft power que se tem em mãos ajudará a encontrar o hard power – e vice-versa. Isso porque os seus poderes já estão dentro de você, a questão é conhecê-los para convidá-los a bailar. Você aceita essa dança consigo mesmo(a)?
“O racional e o intuitivo são modos complementares de funcionamento da mente humana”
Fritjof Capra, físico teórico.